Comando Vermelho encomendou fuzis dentro de penitenciária federal

 
HUDSON CORRÊA
DO RIO

A advogada Beatriz da Silva Costa de Souza recebeu em março passado, dentro da penitenciária federal de Catanduvas (487 km de Curitiba), ordem do CV (Comando Vermelho) para comprar 13 fuzis no Paraguai, segundo o setor de inteligência do presídio. 

A penitenciária de Catanduvas tem autorização judicial para gravar imagens e as conversas entre presos e seus advogados. 

O "relatório de áudio vigilância" aponta que no dia 30 de março um líder do CV, então preso em Catanduvas, pediu para Beatriz comprar "13 perfumes, devagar, não precisando ser todos de uma vez". 

Por conta disso, a direção da penitenciária chegou a proibir visitas dela a presos, mas revogou a medida, no fim de outubro, por exigência do interno para qual advogava e com quem tratou da compra de armas, o traficante Marco Antonio Firmino, o My Thor. 

Além de tratar dos fuzis, o traficante disse à advogada que autorizava "dar uma surra" em um "moleque folgado" que devia dinheiro.

André Penner/AP
Militares patrulham o Complexo do Alemão, no Rio, após ocupação; veja outras imagens
Militares patrulham o Complexo do Alemão, no Rio, após ocupação; veja outras imagens      

A diretoria do Sistema Penitenciário Federal afirma que não havia como impedir o preso ter acesso ao advogado, pois é um direito constitucional, e por isso Beatriz acabou autorizada a voltar à penitenciária. "A suspensão foi mantida até chegar a uma situação em que o advogado tem a prerrogativa. Não poderíamos segurar ad eternum. Ela [a advogada] não tinha condenação", disse a diretoria. 

Conforme a Justiça do Rio, a advogada trouxe de Catanduvas as ordens para os ataques no Rio iniciados no dia 20. Foi uma determinação dos traficantes Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, e Elias Pereira da Silva, o Elias Maluco, também à frente do CV e então presos em Catanduvas. 

"Existem indícios de que Beatriz mantinha relacionamento amoroso com Marcinho", afirmou a Justiça do Rio ao decretar a prisão da advogada na sexta-feira passada. A Folha não conseguiu localizar advogados de Beatriz. 

Os ataques no Rio levaram a um debate sobre o acesso de advogados aos presos que, mesmo nos presídios, se mantiveram líderes do crime organizado. 

Três advogados de traficantes foram presos no Rio na sexta-feira acusados de transmitir ordens de internos da penitenciária federal de Catanduvas (PR) para ações criminosas. 

Na penitenciária, conversas entre advogados e presos são gravadas e filmadas. 

"A OAB já adotou medidas no CNJ [Conselho Nacional de Justiça] contra a medida [filmagens das entrevistas] em Catanduvas. Aguardamos o julgamento", afirma o presidente da OAB-RJ, Wadih Damous. 

"A lei assegura ao preso entrevista com seu advogado de forma reservada. O Supremo Tribunal Federal já disse que isso é fundamental; diz respeito a privacidade e liberdade individual dos cidadãos", acrescentou. 

Delegado da Polícia Federal e diretor do Sistema Penitenciário Federal, Sandro Torres Avelar, defende mudança na legislação para que conversas com advogados e familiares sejam gravadas sempre. 

"O que se busca nos presídios não é produzir provas contra os presos, mas a segurança do sistema. Quando fazemos um monitoramento, estamos procurando evitar fugas, rebeliões e que continuem comandando o crime organizado, apesar de estarem dentro dos presídios", afirmou o diretor. 

O juiz federal Nilvado Brunoni, de Curitiba, avalia que é preciso amadurecer a discussão. "Podemos chegar à conclusão que um presídio de segurança máxima tem que tirar todos os direitos, inclusive a visitas íntimas, para evitar contato com o mundo externo", disse.

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